sexta-feira, 25 de março de 2016

Lumpencultura, bolivarianismo e golpe

por Almir Pereira



Por que não tomar parte na luta de massas governistas e anti-governistas que ocupa as ruas a favor e contra o impeachment de Dilma Roussef? O impeachment é um golpe de Estado por falta de base jurídica como quer Dilma e seus aliados? O impeachment é o retorno do império da lei como querem os partidários do impedimento da presidente?

As massas sujeito zero burguês sabem que o segundo passo do impeachment é a implantação do Plano Temer, que vai atacar frontalmente os direitos sociais e o que ainda resta dos serviços públicos do país. Por isso tais massas se agarram à defesa da presidente como seu último baluarte de resistência ao plano burguês de Temer.


Acontece que ao fazer isso as massas sujeito zero burguês apostam em uma posição política regressiva, já que a contrarrevolução bolivariana de Dilma está acelerando a catástrofe econômica e política do Brasil. Dilma é parte da implosão econômica a que o bolivarianismo (Era FHC + Era Lulista) levou o país e sua reação à tal implosão é de uma indefinição extrema, inclusive com traços de reação anti-social. O desencaixe Brasil do capitalismo corporativo digital mundial em virtude da estratégia bolivariana de manter-nos sob o domínio do capitalismo de engenho lançou a nação no abismo da desindustrialização e da submissão ao capitalismo de commodities (agrícolas e minerais). A crise também é uma crise da hegemonia do capitalismo de commodities no bloco-no-poder.


Em uma demonstração de total falta de rumo e de inconsequência, Dilma acabou de sancionar a lei Mateus (lei Aloísio Nunes Ferreira – PSDB), a lei anti-terror, e garantiu um dispositivo totalitário funesto para que Temer aplique, assim que assuma a presidência, seu plano burguês contra as massas, do funcionalismo público e defensoras dos direitos sociais.


Outro traço míope das massas sujeito zero burguês ao apoiarem Dilma é o de se deixar subssumir à lumpencultura que é dominante no atual governo. JP Bandeira demonstrou em texto recente como a lumpencultura tem um papel preponderante na desterritorialização do Estado nacional. Subssumidas a tal cultura política as massas sujeito zero burguês alienam a defesa dos direitos sociais à subclasse política lúmpen, que tem como objetivo ontológico o uso privatista dos recursos públicos.


A garantia dos direitos sociais e do Estado brasileiro é indivisível de uma recusa frontal da lumpencultura da subclasse política. As massas sujeito Ø burguês estão inscrevendo-se no imaginário nacional como defensoras da fração lumpen de esquerda, da subclasse política brasileira.


Num provável governo Temer o combate a tais massas irá usar essa imagem para atacá-las como massas coniventes com a corrupção. No entanto, tais massas já se alienam ao imaginário bolivariano há décadas e seu destino já parece estar selado, assim como o destino do governo Dilma: ser suplantada por um golpe de Estado.


O tema do golpe de Estado colocou em campos opostos alguns ministros do STF e a presidente Dilma Roussef na semana que passou. Para Dilma não há base jurídica para seu impeachment, por isso o trâmite deste no Congresso seria um golpe de Estado em gestação. Para os ministros Dias Toffoli e Cármen Lúcia, do STF, se o Congresso aceitar a proposição de impeachment, que lá tramita atualmente, isso não é golpe, mas apenas um procedimento constitucional.


Do ponto de vista jurídico os ministros do STF estão corretos, excluindo-se o adendo que Eduardo Cunha fez à petição inicial baseada nas “pedaladas fiscais”. Cunha anexou ao pedido as denúncias feitas por Delcídio do Amaral ao Ministério Público Federal. Esta ação de Cunha foi uma flagrante ilegalidade golpista, que a Comissão Especial do Impeachment já corrigiu descartando tal anexo.


A questão do golpe de Estado não é jurídica como afirma Dilma. Ela é política. Conversando com um amigo acerca disso ele declarou: “se o atual processo for golpe, como quer a Dilma, então o impedimento de Collor em 1992 também foi golpe”, juridicamente meu amigo está correto, mas politicamente é a Dilma que está certa, embora ela não afirme que é um golpe de Estado apenas do ponto de vista político.


Em 1992, Itamar Franco desferiu um golpe de Estado em Collor e nas massas democráticas que se opunham ao déspota. Tomou o poder um político pusilânime que se manteve calado diante do despotismo collorido até vislumbrar o momento favorável à tomada do poder. A substituição do déspota pelo pacto oligárquico que gestaria o bolivarianismo de FHC+Lula não era o que as massas democráticas de 92 almejavam.


Já é quase um fato que o PMDB e congêneres desembarcaram da liderança que Dilma Roussef/ PT e Lula exercem no modelo político lúmpen? Por que isso está acontecendo? Porque não acreditam mais na capacidade de liderança destes para reorganizar a política e a economia e acham mais viável um novo pacto lúmpen-burguês com o PSDB. Porque o PMDB e congêneres chegaram a esta conclusão? Porque eles entendem que o programa de saída da crise está consubstanciado nos planos Temer I e II (capitalismo de engenho sem direitos sociais e sem o Estado brasileiro) e não lhes parece que seja viável fazer o PT aceitar isso, por mais que o partido de Lula já tenha feito várias concessões inimagináveis ao passado petista. Além disso, os conspiradores do PMDB-PSDB esperam que a derrubada do governo Dilma sirva de bode expiatório para salvar da Operação Lava-jato a fração lumpen-oligárquica (PSDB/ PMDB etc) que subirá ao poder com o impeachment.


Em 2016 o PMDB está consolidando “sua identidade de o maior partido conspirador da era da Constituição de 1988”. No texto deste link pode-se entender em detalhe como a não regulamentação, até hoje, dos crimes de responsabilidade do presidente da república, exigida pelo Parágrafo Único do artigo 85 da Constituição, de inspiração peemedebista, garante uma situação constitucional ao sabor da formação do algorítimo/consenso ditatorial da classe política contra o presidente da República”.

A conspiração de Michel Temer para aceder ao cargo de presidente da república não o transforma num criminoso? No emaranhado de crimes eleitorais que envolve a Presidente da República, seu vice e uma fração expressiva do Congresso Nacional só uma eleição geral em nível federal pode restabelecer alguma legitimidade nos termos da Constituição de 1988, para a qual o povo é o soberano. A dissolução da representatividade a que a lumpencultura relegou os poderes executivo e legislativo federais só pode ser superada por uma eleição geral limpa e confiável. Qualquer outra alternativa representa um golpe de Estado contra a soberania popular e o aprofundamento de conflitos que só podem nos levar em direção ao pior.

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