resenha de Almir Pereira
O marco formal de encerramento da ditadura civil-militar, que governou o Brasil a partir de 1964, foi a promulgação da atual Constituição, em 05 de outubro de 1988. No entanto, só foi com a eleição direta para a Presidência da República, em 1989, que se encerrou o processo formal de transição. O formal, no entanto, pouco serve para demonstrar o que se passou na superfície da luta política cotidiana do final da década de 1970, quando passou a valer a lei da anistia (1979), até a eleição de Collor, dez anos depois.
O marco formal de encerramento da ditadura civil-militar, que governou o Brasil a partir de 1964, foi a promulgação da atual Constituição, em 05 de outubro de 1988. No entanto, só foi com a eleição direta para a Presidência da República, em 1989, que se encerrou o processo formal de transição. O formal, no entanto, pouco serve para demonstrar o que se passou na superfície da luta política cotidiana do final da década de 1970, quando passou a valer a lei da anistia (1979), até a eleição de Collor, dez anos depois.
As marcações históricas ou jurídicas, por serem formais, operam
pela lógica do substantivo, o que recalca as disputas diárias entre
os atores políticos, produtoras estas das reviravoltas políticas
que acabam por produzir mudanças formais ou novas relações de
força que nem sempre se formalizam. Os artigos jornalísticos sobre
política nos dão um olhar impressionista desse cotidiano, mas como
o jornalismo tem que ficar circunscrito ao senso comum de seus
leitores, isto o aprisiona a uma analítica muito vaga, condenando-o
para sempre ao impressionismo. Os artigos especializados na grande
mídia acabam sofrendo do mesmo mal, pois não podem ultrapassar um
certo “senso comum douto”(Bourdieu), característico do leitor
mediano universitário.
A leitura dos significantes que pilotam o cotidiano da política
demanda uma técnica própria?
O livro Leitura da Política Brasileira (1985-1992) foi escrito para demonstrar o quanto uma técnica assim é necessária, possível e produtiva. Fruto de um minucioso trabalho de pesquisa, pelo qual o autor monta um quebra-cabeças de milhares de pequenas peças da conjuntura política, que vai do governo Figueiredo até a posse de Itamar Franco, o livro impressiona, primeiramente, pela reunião micrométrica de fatos e discursos políticos cotidianos, que respaldam as hipóteses do autor, como se tivessem que ser provas irrefutáveis a serem expostas diante de um rigorosíssimo tribunal.
O livro Leitura da Política Brasileira (1985-1992) foi escrito para demonstrar o quanto uma técnica assim é necessária, possível e produtiva. Fruto de um minucioso trabalho de pesquisa, pelo qual o autor monta um quebra-cabeças de milhares de pequenas peças da conjuntura política, que vai do governo Figueiredo até a posse de Itamar Franco, o livro impressiona, primeiramente, pela reunião micrométrica de fatos e discursos políticos cotidianos, que respaldam as hipóteses do autor, como se tivessem que ser provas irrefutáveis a serem expostas diante de um rigorosíssimo tribunal.
Apesar do rigor intelectual, não se trata de um livro para
especialistas. Trata-se de um texto destinado ao leitor ambicioso,
que quer ultrapassar as conhecidas análises, jornalísticas ou
acadêmicas, que só fazem reiterar o que já sabemos ou, às vezes,
acrescentar algum novo detalhe que pouco ou nada alteram a nossa
capacidade de entendimento dos fatos. É, portanto, um texto que tem
a pretensão de relocalizar os marcadores que nos orientam na
interpretação da recente história política do Brasil e, com isso,
jogar alguma luz sobre o obscuro presente que atravessamos.
Passada a euforia que se instalou em nós com as jornadas de junho
de 2013, poucas foram as análises políticas que conseguiram medir a
extensão e a profundidade, em detalhes, da crise instalada na
política brasileira da atualidade. Leitura da Política
Brasileira, apesar de não ser
sobre o ano de 2013, mostra-nos como a
crise atual é a de um
modelo político estabelecido desde o impeachment
de Fernando Collor: “modelo político que fez dos partidos os
sujeitos do poder político ao lado da presidência da República
durante os governos Itamar Franco, FHC e Lula.” Tendo
superado as crises política e econômica dos anos 1980, a República
Democrática vê ressurgir a crise política no horizonte, fruto do
movimento das placas tectônicas que compõem o atual bloco no poder.
O
autor do livro,
José Paulo Bandeira, lança dois desafios em relação à
interpretação da política brasileira contemporânea: como encaixar
o autocratismo do governo Sarney e a tirania de Collor no processo de
“abertura democrática”? Quem se der ao trabalho de ler o livro
poderá verificar, passo a passo, como o processo de democratização
formal caminhou simultaneamente com governos essencialmente
antidemocráticos.
Como na tradição da ciência política de esquerda, Leitura da
Política Brasileira não descuida em nenhum momento de situar os
dilemas políticos das suas relações com os dilemas econômicos. A
política não deixa de ser considerada economia-política em nenhum
ponto do livro, já que a mais-valia e o “mais-poder” são faces
da mesma moeda. O economicismo, no entanto, é ignorado o tempo
todo, pois não há nada mais nefasto para a boa reflexão política
que este tipo de abolição do sujeito.
Leitura da Política Brasileira (1985-1992), José Paulo Bandeira da Silveira, editora Publique-se! Livro digital. Click aqui.
Leitura da Política Brasileira (1985-1992), José Paulo Bandeira da Silveira, editora Publique-se! Livro digital. Click aqui.
Parabéns pelo trabalho, Almir.
ResponderExcluirSua resenha desperta intensamente o nosso interesse pela leitura da obra. Destaco a relação que você fez entre o livro e os acontecimentos recentes na vida cotidiana dos brasileiros, levando-nos a leitura do mesmo para melhor compreensão das transformações pelas quais estamos passando. Além disso, destaco o uso de uma linguagem acessível e atraente aos leitores.